Transformação do etanol em commodity : perspectivas para uma ação diplomática brasileira

Este trabalho foi concluído em janeiro de 2011, depois de dois anos de pesquisas sobre a atuação brasileira no setor energético, em particular na promoção do etanol como commodity. É uma tentativa de sistematizar a ação diplomática do Brasil nas suas dimensões bilateral, plurilateral e multilateral,...

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Main Author: Kloss, Emerson Coraiola
Format: Online
Language: por
Published: Brasília : FUNAG, 2012
Online Access: https://consultaredebie.decex.eb.mil.br/pergamum/biblioteca/index.php?codAcervo=404278
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Summary: Este trabalho foi concluído em janeiro de 2011, depois de dois anos de pesquisas sobre a atuação brasileira no setor energético, em particular na promoção do etanol como commodity. É uma tentativa de sistematizar a ação diplomática do Brasil nas suas dimensões bilateral, plurilateral e multilateral, que tem como eixo de análise o relacionamento do país com os outros dois grandes produtores e consumidores de biocombustíveis: os Estados Unidos e a União Europeia. O interesse brasileiro de criar um mercado internacional para o etanol passa necessariamente pela concertação com essas regiões, seja como meio para promover a cooperação com terceiros países, seja para superar entraves comerciais que impedem o livre trânsito de etanol. A ação diplomática brasileira para promoção de um mercado internacional para o biocombustível é examinada a partir da interação do Brasil com os outros dois grandes atores, tanto no âmbito dos mecanismos de diálogo bilateral existentes, quanto em foros como a Organização Internacional para Padronização (ISO), a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Fórum Internacional de Biocombustíveis (FIB) e a Parceria Global de Bioenergia (GBEP). Após a entrega do trabalho ao Instituto Rio Branco como requisito para aprovação no Curso de Altos Estudos, o principal desafio no processo de revisão que levou a sua publicação foi mantê-lo atualizado à luz da contínua evolução de um tema que, por suas características, é particularmente dinâmico. O ano de 2011, nesse contexto, foi marcado por grandes mudanças nos principais mercados de etanol, as quais provocariam alterações no relacionamento brasileiro com seus parceiros no campo dos biocombustíveis, particularmente na dimensão comercial, e cujas consequências de longo prazo ainda estão por serem avaliadas. No Brasil, foi sentido o reflexo de uma conjunção de fatores, domésticos e externos, que levaram à redução da oferta de etanol e, por conseguinte, à importação de grandes volumes do produto, principalmente dos Estados Unidos. Essa foi uma situação inédita para o país, que historicamente detinha a posição de maior exportador líquido de etanol. Algumas explicações foram oferecidas para essa nova conjuntura. Parte do decréscimo da oferta de etanol no mercado brasileiro seria decorrente da baixa produtividade dos canaviais, que não foram renovados. A ampliação do parque de usinas no país também não teria acompanhado o crescimento da demanda pelo biocombustível resultante da ampliação das vendas de veículos flex fuel, que foram impulsionadas pelo crescimento da economia brasileira e o surgimento de uma nova classe média ávida por atender as suas legítimas aspirações de consumo. Argumentou-se, nesse sentido, que o processo de consolidação experimentado nos últimos anos, com aquisições de usinas por investidores externos, teria deixado o setor sem os recursos necessários para realizar novos investimentos, de ampliação da capacidade de produção. Independentemente das razões que provocaram a queda na oferta de etanol, o perfil do comércio exterior de etanol do Brasil alterou-se ao longo de 2011. O Brasil passou a importar etanol, mas não perdeu sua condição de exportador. Favorecido pelo reconhecimento da Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos Estados Unidos de sua condição de ¿biocombustível avançado¿ e pela política de redução de emissões de gases de efeito estufa da Califórnia, o produto brasileiro vendo sendo comercializado com pagamento de um ¿prêmio¿ no mercado norte-americano, do qual não se beneficia o etanol de milho produzido localmente. Outro acontecimento importante foi a expiração da chamada ¿tarifa secundária¿ norte-americana que incidia sobre o etanol importado e do crédito fiscal que beneficiava os distribuidores de combustível na compra do biocombustível que era misturado à gasolina. A melhoria das condições de acesso ao mercado de etanol dos Estados Unidos era um objetivo há muito tempo perseguido pela diplomacia e pelo setor privado brasileiros e, conforme descrito neste livro, esteve sempre presente na agenda dos diálogos bilaterais, inclusive no mais alto nível. Pelas circunstâncias atuais do mercado brasileiro de etanol, não se pode avaliar o real impacto que essa abertura terá sobre as exportações do biocombustível. É de se esperar que haja incremento no volume de comércio com o aumento da competitividade econômica proporcionada pela liberalização comercial daquele importante mercado. É interessante observar que as alterações ocorridas nos dois principais produtores de etanol reforçam o argumento central deste trabalho de que a ampliação do número de países produtores é necessária para a consolidação desse biocombustível como alternativa à gasolina no setor de transportes. Se não fosse pela oferta de etanol dos Estados Unidos, as consequências negativas da redução na produção brasileira teriam sido ainda mais graves, o que poderia comprometer a confiança do consumidor no etanol e da indústria automobilística no futuro dos veículos flex fuel. Na Europa, intensificou-se o debate sobre a sustentabilidade da bioenergia, com implicações para as ações empreendidas pelo Brasil em favor da transformação do etanol em commodity. Em razão da implementação da Diretiva de Energias Renováveis, esquemas de certificação passaram a ser autorizados pela UE e utilizados pelos exportadores brasileiros. As primeiras usinas brasileiras foram certificadas pelo esquema Bonsucro, cujos indicadores foram desenvolvidos em conjunto com o setor privado brasileiro para também refletir as características da produção de cana-de- -açúcar no país. São esquemas voluntários, mas exigidos para cumprimento dos requisitos de sustentabilidade da União Europeia. Duas outras questões de relevância para os interesses brasileiros seguem sem acordo no âmbito comunitário. A primeira diz respeito ao controle de emissão de gases de efeito estufa provocados pela mudança indireta do uso da terra (iLUC, na sigla em inglês) na produção de biocombustíveis. O tema divide opiniões na burocracia da UE. Enquanto a área responsável por energia entende que ainda não há maturidade científica para aplicação de critérios iLUC, outros setores da Comissão Europeia, como a Direção-Geral de Meio Ambiente, sugerem a aplicação de um ¿fator iLUC¿ destinado a ¿compensar¿ emissões indiretas causadas por supostos deslocamentos de produção de alimentos por produção de biocombustíveis. O segundo aspecto está relacionado à proibição de ingresso no espaço comunitário de biocombustíveis que tenham sido produzidos em ¿pradarias altamente biodiversas¿. Não há, ainda, decisão das autoridades comunitárias sobre o alcance do termo, o que impede sua aplicação imediata. A depender da definição adotada, poderiam ser consideradas como ¿pradarias altamente biodiversas¿ áreas como o Cerrado brasileiro ou a savana africana, ainda que já antropizadas. Em outras palavras, projetos nas atuais áreas de expansão da produção de cana-de-açúcar no Brasil, que ocorre, sobretudo, em pastagens degradadas no Centro-Oeste poderiam ser afetados negativamente. Ficariam igualmente prejudicadas as iniciativas de produção de biocombustíveis em larga escala em países africanos, cuja viabilidade depende de acesso aos mercados consumidores europeus. A diplomacia brasileira deve continuar a acompanhar com atenção dos desdobramentos na implementação da Diretiva sobre Energias Renováveis da UE por seus potenciais impactos sobre as exportações brasileiras de biocombustíveis. Requisitos obrigatórios de sustentabilidade podem ser ferramentas importantes para promover os aspectos positivos e mitigar os impactos negativos da produção e uso da bioenergia. Eles não devem, entretanto, constituir restrições injustificadas ao comércio e devem ser suficientemente flexíveis para levar em conta as características de sistemas de produção distintos entre si. São significativos os desafios para a criação de um mercado internacional para o etanol. A ampliação do número de países produtores, particu